8 de setembro de 2007

Não quero pátria

O escritor russo Leon Tolstói disse que o patriotismo é tão nocivo como sentimento humano quanto é estúpido como doutrina, e Millôr Fernandes, parodiando o lingüista e escritor Samuel Johnson, que havia dito bem anteriormente que o patriotismo é o último refúgio do canalha, escreveu que a pátria é o primeiro refúgio do canalha.

Ontem, 7 de setembro, os brasileiros, considerados patriotas de chuteira, descansaram em mais um feriado para comemorar o Dia da Pátria. De minha parte, sou alinhado ao Millôr e a Tolstói, e me considero um despatriado. Não tenho a menor intimidade com esse sentimento quase patético de amor a uma coisa que, na teoria, não é nada, porque não tenho amor maior ou menor a um dito brasileiro - só porque nasceu no mesmo território imaginário que eu - do que a um cidadão que nasceu no Zimbábue. Ele é tão humano quanto eu, e se eu acreditar numa coisa apenas retórica chamada Brasil, a humanidade do outro se esfacela.

Só existem guerras porque alguém inventou essas linhas imaginárias que dividem territórios onde, para lá devem viver muçulmanos, para cá, judeus, a Leste, católicos, e, a Oeste, sabe-se lá que outro tipo de homem carregando que outro tipo de crença.

Aos nove anos de idade, única vez em que desfilei numa parada de 7 de setembro, quis desaparecer de vergonha. Não compreendia o sentido daquelas pessoas me olhando, sorrindo por uma pátria, cujo presidente era um ditador, acenando bandeirinhas que escondiam na ingenuidade verde-amarela a crueldade e a estupidez de uma guerra civil surda, a mando de outra pátria, chamada Estados Unidos da América.

Pelo conceito abstrato de pátria, jovens soldados norte-americanos matam civis, mulheres e crianças no Iraque, outra pátria que se defende a qualquer custo, como podem, de um invasor que quer roubar uma de suas riquezas, o petróleo, a se aproveitar do espírito patriótico dos jovens soldados. Que outro motivo teria um jovem para matar?

Se não há armas químicas, o que já era um mote furado - pois o país chamado Estados Unidos é o único que pode ter armas nucleares e químicas - o que aqueles soldados fazem lá, morrendo e matando gente? Por causa de um sentimento torpe, baseado em linhas imaginárias e um ódio gerado pela diferença. A pátria é o alimento do preconceito, porque o outro, aquele vizinho que mora do outro lado da linha imaginária, só porque tem outra cor ou olho puxado ou tem cabelos e barbas longas, deve ser eliminado. Se isto não for insanidade coletiva, não posso imaginar o que possa ser.

No próximo dia 11, serão lembrados no mundo todo, e nos Estados Unidos com mais "patriotismo", seis anos do ataque às torres gêmeas em Nova York, quando uma dezena de suicidas, por amor à pátria e a Maomé (uma junção, religião e política, ainda pior do que o patriotismo solitário), decidiu parodiar a bíblica história de David e Golias e sacrificar civis que não escolheram estar na guerra.

Por isso, sou como o compositor baiano, Caetano Veloso, que canta: "Minha pátria é minha língua, eu não quero pátria, tenho mátria, e quero frátria".

5 comentários:

Anônimo disse...

Se tem qualquer coisa de ultrapassada é a idéia de pátria.
Mesmo os que vão ver os desfiles, além dos políticos e militares que fingem orgulho ao ver armas da época da 2a. guerra, o fazem mais por ritual ou coisa que o valha do que por amor ao país.

ANALUKAMINSKI PINTURAS disse...

Olá! Pátria, afinal, é o amor à Vida, que resiste em nosso coração e alma, apesar das intolerâncias, indiferenças, ignorâncias e intempéries...
Te vi noutro dia, lá na exposição da Vera SAbino, quase fui falar contigo, mas sou tímida... Afinal, ainda o ar arrogante de alguns intelectuais cria uma barreira, para almas mais introspectivas, como a minha... Abraços.

Fábio Brüggemann disse...

também sou tímido, analuka, e muita gente confunde minha timidez com arrogância. da próxima vez, se aprochegue. abçs.

Anônimo disse...

Postei um comentário há uns dias, mas pelo jeito não foi salvo. Que pena, nele eu contei um sonho que tive com você. Ora, ora!
Margarida Baird

Fábio Brüggemann disse...

Ah, conta de novo, porque não apareceu aqui. Gracias pelo comentário lá de cima. Bjs.

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