Os outros
Albert Camus, o escritor francês, nascido na Argélia, autor de O estrangeiro, começa um de seus livros, O mito de Sísifo, com uma frase instigante: “O suicídio é o único problema filosófico verdadeiramente sério, pois julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida é responder a questão fundamental da filosofia”. A frase aparentemente pode parecer uma apologia ao suicídio, mas Camus discorre é sobre o absurdo da vida, e faz apologia à revolta como possível alívio à incompreensão.
Mais do que o suicídio, claro, como metáfora da escolha, o grande problema filosófico é o que chamamos “outro”. Reside nesse “outro” duas ideias das que mais adoecem o ser humano: o medo e a expectativa. A espera é sempre pelo outro, e o medo é sempre medo do outro. Alguém pode dizer que a natureza também causa medo. Mas no geral, confiamos mais na natureza do que no “próximo”. Um terremoto, por mais que seja arrasador, pode nunca acontecer. E é tão maior do que nós que, ou vivemos nessa constante espera por ele o (que é assustador mesmo), ou deixamos para lá. O que chamamos, talvez, de destino.
Mas o “outro” é que é cruel, justamente porque ele pode escolher. Ao contrário da natureza, o outro é movido por paixões, decisões momentâneas, pode vir ao teu encontro nos próximos cinco minutos, como pode nunca mais aparecer. O inferno, sim, são os outros, disse também Jean-Paul Sartre, porque o outro é sujeito a terremotos de escolhas mais cruéis do que um tremor de terra “real”.
A felicidade, na minha mais modesta e singela ideia que eu possa ter dela, virá no dia em que eu puder acordar e pensar que não espero nada de ninguém, ou que ninguém pode me colocar medo. Sim, como dizia o velho ditado latino: nec spec nec metu (sem medo, sem esperanças) A esperança é uma droga, ela é a morfina, ela se traveste de ilusão e aprisiona. Ela nos faz deixar olhar para o lado, para o sol, para a árvore, porque esperamos aquilo que sabemos que nunca virá. A esperança é o único problema filosófico, porque resido no “outro”. E o outro é sujeito de escolhas, seja para ter como para se deixar ter. E contra isso, não podemos fazer nada.