8 de maio de 2010

Fora, pavão

O pavão é um bicho esquisito. Quero dizer, é feio mesmo. Não entendo por qual motivo alguém resolveu criar o adjetivo “pavonear” para falar de pessoas que gostam de aparecer. Para parecer um pavão? Sei não.

Mas conta uma das fábulas de Estopo (sic), um filósofo latão (sim, destes que vivem na lata de lixo, como viveu Diógenes, o cínico), que o pavão queria ser o rei da floresta. Mas como não tinha porte de leão – o rei forjado a urros, garras e dentes –, teve que fazer uma aliança. Seus aliados (os do pavão, é claro) concordaram que ele fosse coadjuvante de um reinado estranho, porque multifacetado, cuja única plataforma era criar cargos públicos em regiões afastadas do centro do reino, e, assim, além de empregar amigos, gastar uma grana federal do reino. Consta que toda grana que o reino arrecadava deveria ser usada para melhorar a educação, a saúde, a segurança pública, a cultura e a infraestrutura pública dos outros animais que pagavam impostos.

Porém, o rei não sabia o que era política pública. Ele era apenas um agregador astuto, mais raposa do que leão até. De cultura, nada entendia. Mesmo com toda a bicharada saindo em passeata, pedindo fundos, editais, transparências, o leão nunca quis ouvir esses bichos. O rei era tão iletrado, que achava que cultura, turismo e esporte eram a mesma coisa. Mas qualquer um, até o ingênuo coelho, sabe que uma coisa nada tem a ver com a outra.

Depois de muito tempo no poder, o rei quis fazer outra coisa na vida, outro cargo público, talvez. E é claro, o plano do pavão deu certo. De vice-rei, virou rei. O rei pavão I. Acontece que antes desse fato, O Diário da Selva publicou gravações nas quais o pavão, apesar de não ser macaco, foi pego com a boca na botija, recebendo uma grana para safar uma empresa privada de um processo público. Mas tem uma lei bem esquisita no reino, que proíbe que o próprio rei seja processado. Nem juízes corujas, nem os outros animais que pagam impostos, se importaram com isso. Se eu fosse um fabulista daquela época, ao invés da palavra fim, escreveria em letras grandes, apesar de parecer um ato bastante solitário num reino cada vez mais estranho: “FORA, PAVÃO”.

Publicado originalmente no Diário Catarinense, 8 de maio de 2010

6 comentários:

Unknown disse...

Sensacionais suas metáforas, ironias e eufemismos usados neste,mais uma vez, genial, texto!
O q fazer, se, nessa selva temos os poderes judiciário e legislativo tão falhos q legitimam o poder executivo,tão vergonhosamente, corrompido? Acho q só nos resta um estilingue para acertarmos o rei leão e o pavão.
Beijos, querido amigo!

Denise de Castro disse...

Fora pavão, galinha e toda esta bicharada podre!!!!
Parabéns Fábio!!!
beijo

Unknown disse...

Ha,ha,ha! Êta pavãozinho danado! A fábula tá ótima. E por falar em pavão, lembrei da obra da Lygia Bojunga Nunes, A Casa da Madrinha, na qual uma das personagens é um pavão, só que nem um pouco parecido com esse.

Lengo D'Noronha disse...

Tenha certeza que a bicharada toda acompanha em coro.

Daniel Olivetto disse...

bicho, mó barato passar por aqui!

Contra o Pavão eu voto no Fabão!

lena muniz disse...

Ah! nada como uma fábula do Estopo pra representar a (i)realidade.

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