1 de maio de 2010

Meninos também escrevem diários

Quando fui garoto, acreditava que os meninos que gostavam de música e poesia eram maricas. E mais ainda os que gostavam de dançar. Ninguém usava os termos gay, homossexual, viado ou bicha. Era maricas mesmo. E eu não queria ser um maricas. É engraçado, mas apesar da feminização do sujeito, o artigo era masculino: “um”, sim, “um maricas”. Mas eu gostava mesmo era de jogar futebol, coisa de menino. Por sorte, hoje tem meninas, como a Graziela Meyer, que gostam de futebol.

Mas um dia, comecei a ler romances, depois livros de poemas, e, enfim, ouvi Chico Buarque, Caetano Veloso e Milton Nascimento, e comecei a gostar de música. Mas peraí, como assim? Eu gostava, gosto, de mulheres, do cheiro delas, do pescoço, daquele osso que aparece nos quadris quando elas são magrelas (daí meu gosto pelas magrelas, talvez), enfim, eu descobri, ouvindo música e lendo poemas, que os meninos gostam mesmo é de contrariar. E eu contrariei. Tanto, que logo logo, mais do que gostar de música, de ler poemas, de gostar de teatro, aquele garoto que fui também começou a fazer tudo isso, a despeito do que os machistinhas e preconceituosos pensavam.

Pra usar um brinco na orelha esquerda, como protesto por uma ditadura que poucos ao meu redor reconheciam como sendo, foi um pulo. E, é claro, a cidade não coube mais em mim. E no dia em que eu fui-me embora eu nem olhava pra trás. Hoje, acho engraçado dançar. Mãos para um lado, olhos procurando o outro sem disfarce (não tem como disfarçar, porque só se dança se for para alguém), pés tentando encontrar um ritmo que o satisfaça, enfim, não danço nada, apesar de saber que se eu soubesse dançar teria todas as mulheres do mundo aos meus pés.

Mas eu nem quero todas as mulheres do mundo. Nem caberiam numa agenda, e eu não tenho tantos ouvidos assim, para tanta boca falando neles. Eu quero apenas aquela que não se importa pelo fato de eu não saber dançar, mas que gosta quando eu seguro a sua mão enquanto ela dança. Sim, aquele garoto, que nasceu tão cedo, tão antes, pertence a um mundo talvez bem estranho à maioria que não lê poesia e ainda acredita em deuses. Aquele garoto continua lendo, se acha o último romântico, sabe pouca coisa do mundo, apesar de desconfiar de muita, e ainda é amigo de muitos maricas. Só não dança, né, que aí já é demais.

9 comentários:

Unknown disse...

essa história aí de ter todas as mulheres por saber dançar é balela.
ainda nao ouvi de nenhuma amiga "olha ali, julie, como aquele gato dança bem.. nossa senhora". não, nunca ouvi isso.
a gente gosta é de homem inteligente. e isso tu tens de sobra!

=)

=*

Anônimo disse...

Todas eu não sei, mas uma boa parte é chegada num gatinho que dança bem! É que a maioria dos homens dança mal, a gente nem espera que ele dancem bem, rs. Mas eu te gosto mesmo assim tá!

Nayana disse...

nhaim, que bonitinho... ^^

:*

Victor da Rosa disse...

grande, fábio! deixando transparecer as primeiras influências das baladas de floripa! gostei da crônica. acho que é uma nova fase de seus textos e de sua subjetividade. todos sabemos que você sempre foi um homem sensível, mas jamais havíamos lido uma declaração tão contundente. um abraço! victor.

Unknown disse...

julie, acho que tu nunca me viu dançar.

Juliana Bassetti disse...

Se ela dança, eu tanso?

ítalo puccini disse...

eu gosto desses teus textos "bem tu", sabes? acho que já escrevi isso por aqui. rsrs

grande abraço!

lau ator disse...

Bom, eu gosto e sei dançar e não tenho todas mulheres do mundo...creio que são minhas mariconadas rsssssssssss.valeu cumpadi

Lengo D'Noronha disse...

Meu pai dançava charleston, eu gostava de ver. Aprendi aos 9, twist.O rock'n roll até os 40, depois disso...nem valsa na formatura da filha.

Mas é bom!

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