26 de junho de 2010

Alianças de araque

A ideia de partido político é muito mais interessante do que o quadro que temos hoje, principalmente no Brasil. O propósito – pelo menos como se iniciou na Grécia e em Roma, e que depois das revoluções Industrial e Francesa se firmou como instituição – era agrupar pessoas com um mesmo ideal político, ou para seguir um determinado líder. No Brasil, muitos líderes ainda se acham donos dos partidos.

Nos Estados Unidos, único país onde o presidencialismo faz sentido, por causa do projeto de nação ser profundamente aceito pela maioria, existe apenas duas agremiações com um número de filiados suficiente para decidir uma eleição. Ainda assim, qualquer cidadão pode ser candidato a cargo público eletivo. No Brasil são 27 partidos registrados, e ainda mais o mesmo número em processo de legalização. Mas ao contrário dos Estados Unidos, a lei não permite candidaturas independentes.

Para se ter uma ideia da discrepância da democracia brasileira, apenas pouco mais de 2% da população é filiada a algum destes partidos. E é um engano enorme acreditar que tenham uma bandeira a defender a mais do que a manutenção do poder. E para tanto, os supostamente de esquerda aceitam como vice um supostamente de direita sem a menor cerimônia.

A lei eleitoral é tão esdrúxula, que no Estado de São Paulo, por exemplo, numa das eleições para deputado federal, um candidato foi eleito por apenas 26 votos, enquanto outros, que obtiveram mais de 50 mil votos, não o foram. Sinal de que vagueamos numa enorme e perigosa ignorância política, que se transforma cotidianamente em uma democracia fragilíssima.

Na Santa e Brega Catarina, os partidos demonstram todos os dias que não fogem à regra, porque buscam alianças não importa com quem, desde que se mantenham no poder ou o alcancem. Programas, ideias, projetos, debates sobre a real política pública, disso ninguém fala. Nem os partidos, nem, infelizmente, os eleitores.

Diário Catarinense, 26 de junho de 2010.

12 de junho de 2010

Torcer pelo Brasil

Começou ontem mais uma Copa do Mundo. Sim, eu torço pelo Brasil, do mesmo modo como torço pelo planeta inteiro. Torço para que não exista mais um único faminto, um único assassinado, um único doente por falta de grana, para que todo mundo possa saber ler e, mais importante, saiba compreender o que lê. Torço para que os governantes de todos os países sejam menos babacas, e para que as grandes corporações comecem a pensar que, afinal, se elas querem continuar a ser grandes precisam de pessoas saudáveis, instruídas e com grana no bolso. Mas não é o que acontece, infelizmente, apesar da minha torcida.

Não torço apenas pelo fim da miséria crônica, seja de alimento, seja de conhecimento, da maioria dos países, porque é um engano acreditar que a miséria é privilégio dos países pobres. Todos viram o tanto de miseráveis que moravam na Georgia quando o furacão Katrina passou por lá. Têm miseráveis em Paris, em Barcelona e em Nova York.

Minha torcida é universal, e minha lógica me faz torcer pelo que me dá prazer. Por ter sido um guri bem magro e fraco, nunca torci para os fortes. Até porque os fortes não gostam de pessoas inteligentes, até porque, desgraçadamente, de nada adianta palavra contra um revólver, de nada adianta argumento diante da força. Torço, portanto, pelo belo, como no poema da poetisa Safo: “Quem é belo / é belo aos olhos – e basta. / Mas quem é bom / é subitamente belo”, e pelo bom.

Dentro dessa lógica, confesso, bastante idiossincrática, não vou torcer pela seleção brasileira, porque seu técnico não privilegiou o belo e o bom, mas o forte e o feio. Vou torcer pela seleção que jogar o futebol mais bonito, ainda que seja perdedora, como já aconteceu tantas vezes, em tantos campeonatos, em tantas copas do mundo. O futebol, nesse caso, é quase igual a tudo na vida. Mas continuarei torcendo pelo Brasil, para que sua população torça para um país mais letrado, justo e alimentado, do mesmo modo como torce pela sua seleção de futebol.

Publicado também no Diário Catarinense, 12 de junho de 2010.

5 de junho de 2010

Direitos de ir e vir

É quase inacreditável que o aparato policial, cujo mandatário é o governador do Estado (o mesmo que só não pode ser processado, apesar de todas as gravações explícitas que o incriminam, apenas porque o ex-governador deixou de bandeja o cargo pra ele), ainda continua usando quase todo seu contingente para prender e bater em estudantes. Enquanto isso, casas são arrombadas, pessoas são assassinadas, automóveis são roubados, sem que toda essa “inteligência” militar possa conter.

Essa ideia de que o governo, usando ilegítima e ostensivamente a polícia para proteger não um patrimônio público, mas privado, que são as empresas de ônibus, é balela. A questão em jogo não é o direito de ir e vir do cidadão que usa automóvel, que é minoria, mas a do que não usa, que é maioria. O fato de a Ilha de Nossa Senhora dos Aterros ter o pior sistema de transporte e o mais caro inviabiliza, na verdade, o direito de ir e vir da maioria que usa o sistema. E o modo que essa maioria escolheu para protestar contra essa barbaridade é fazer passeata, porque usando de argumentos mais que sólidos e razoáveis parece que não funciona.

O debate que o Diário Catarinense promoveu com o vice-prefeito, João Batista Nunes, e com um dos manifestantes, Diógenes Moura Breda, mostrou quem tem mais argumentos e inteligência. O vice-prefeito, ao negar que a proposta de municipalização não será aceita porque não deu certo em outras cidades só não é mais infeliz do que a de ele mesmo mandar pra “sua cidade” aqueles que não gostam do sistema de transporte. Também não é verdadeira a informação de que não deu certo. Existem experiências bem interessantes em Fortaleza, e até mesmo a gestão de Erundina, em São Paulo, que, se “não deu certo”, como diz o vice-prefeito, não foi pela ideia em si, mas pela falta de fiscalização e pelos vícios políticos e administrativos das gestões posteriores. Mas isso é fácil de corrigir. Além do mais, a gestão do atual prefeito também não deu certo (principalmente porque não fez nada pelo direito à mobilidade, e ainda atrapalha) mas nem por isso vamos propor sua privatização.

Publicado originalmente no Diário Catarinense, 5 de junho de 2010.

SOBRE O ÓDIO

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