14 de janeiro de 2012

VIAGEM AO URUGUAI

       No dia 27 de dezembro, eu e minha mulher, Gabi, mais um casal de amigos, Vanessa e Marcus, saímos rumo ao Uruguai, em busca do por do sol mais bonito que já vi. No mesmo dia, ao entardecer, depois de atravessarmos todo o pampa gaúcho, chegamos à fronteira, na cidade de Santana do Livramento. A cidade guarda ainda uma arquitetura baixa e alguns exemplares do que parece ter sido um passado de fartura econômica, baseado, principalmente, na pecuária de corte. Do lado uruguaio, Rivera é um centro de compras livre de impostos. Grandes lojas com artigos eletrônicos, perfumes e bugigangas importadas. Uma espécie de Ciudad del Leste, do Paraguai, só que mais organizada e limpa. Ali, do outro lado da calçada, a comida já não é a mesma do Brasil e a cerveja Norteña (uma das melhores pilsens que já tomei), descobri depois, só é vendida na fronteira ou no Brasil.
         De Rivera, atravessamos o pampa uruguaio e fomos para as termas de Almirón, no oeste uruguaio, quase na fronteira com a Argentina, onde acampamos duas noites. O espaço bem estruturado, com piscinas de águas quentes, fica ao lado da pequena vila de Guichón, na cidade de Paysandu.
No dia seguinte, viajamos para Colônia do Sacramento, cidade tombada pela Unesco como patrimônio histórico e cultural da humanidade. Única vila colonizada pelos portugueses no Rio da Prata, Colônia  é o sítio onde eu gostaria de morar, principalmente pelo fato de saber que nenhum prefeito poderá autorizar a derrubada da história e seu patrimônio, do mesmo modo que nenhum especulador imobiliário e seus prédios tediosos poderá construir seus monstrengos arquitetônicos. Colônia tem uma particularidade histórica paralela à Ilha de Nossa Senhora dos Aterros. Em 1777, os espanhóis invadiram a ilha de Santa Catarina. No mesmo ano, invadiram também Colônia do Sacramento. Porém, o Tratado de Santo Ildefonso, diplomaticamente feito na Europa enquanto centenas de vidas eram enterradas nos fortes de Colônia durante a invasão – ao contrário da invasão à Ilha de Santa Catarina, onde nenhum tiro de canhão foi dado – restabeleceu as linhas gerais do Tratado de Madri. Pelo documento, Colônia e o território das Missões pertenceriam à Espanha, e a Ilha de Santa Catarina voltaria a Portugal. No pôr do sol em Colônia, vendo o barco que leva, em uma hora, a Buenos Aires, uma pergunta não me saiu da cabeça. Se Colônia e a Ilha de Santa Catarina são tão contemporâneas, por que a cidade uruguaia preservou sua história e a Ilha tratou de destruí-la?
        Depois disso, seguimos a Montevidéu. Chegamos diretamente ao mercado do porto, onde não existe um ala vendendo tênis e calçados da China. A vida pulsa com suas parrilhadas, empanadas, milanesas, queijos e uma pulsante história gravada nas suas paredes. Não há viagens sem comparações. A cada lugar no Uruguai, sempre vinha a pergunta: em que lugar, em que beco do tempo perdermos tanta história para dar espaço a um “novo-riquismo” tão pobre, tão sem referências, tão sem conteúdo quanto o da Ilha de Nossa Senhora dos Aterros? Pergunto mais: haveria ainda tempo de resgatar o amor a essa história presente, para, quem sabe, preservarmos para o futuro a breguice que estamos construindo?

DE VOLTA, PELO LITORAL
         Comparações à parte, seguimos para o litoral uruguaio. Passamos por Punta del Leste, balneário totalmente sem graça, lembrando Balneário Camboriu, com a vantagem de que lá eles são mais espertos, pois não construíram prédios à beira-mar para tapar o sol na praia às três da tarde. Depois do almoço em Punta, armamos as barracas em Piriápolis, um balneário bem menor. Na praia, pela primeira vez na vida vi uma centena de praieiros aplaudindo o por do sol.
        De Piriápolis, chegamos a Cabo Polônio, uma reserva natural, onde não se pode chegar de carro, nem acampar. Sendo assim, acampamos na barra de Valizas, a sete quilômetros dali. Cabo Polônio é habitat de milhares de leões marinhos, com seus urros inconfundíveis e sua aparência bizarra.
A vila de Valizas lembrou a Guarda do Embaú nos anos de 1980. A vida ali é toda arte e cultura. Músicos, bailarinos, malabaristas, todos respiram arte o dia todo. A noite, em Valizas, parece um grande palco. A cada esquina uma atração, e o Candombe, música típica dos negros uruguaios, é seguida pela multidão. Ali, quase no meio do nada, estávamos livres de uma praga que atacou o resto do Uruguai. A praga era um pseudo cantor brasileiro, o qual não recordo o nome, nem faço questão de lembrar, que insistia em cantar (se é que podemos chamar a isso de canto) uma frase que dizia qualquer coisa como “ai se eu te pego”. O Brasil que já exportou Tom Jobim, Caetano, Tom Zé e Chico Buarque, entre outros, decaiu imensamente por conta de uma geração cuja formação vem apenas da televisão e de uma legião de pais intelectualmente omissos.
De qualquer modo, o Uruguai é lindo, os uruguaios são de uma simpatia ímpar, demonstram gostar muito do Brasil, mas amam mais ainda falar do “maracanazo”, o dia inesquecível para eles, quando fizeram o Brasil ficar em silêncio, tal e qual é necessário ficar diante do por do sol dos pampas uruguaios.

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