25 de setembro de 2010

Reforma política urgente

O que mais se ouve por aí em tempos de campanha eleitoral são estas musiquinhas infames que não dizem nada com nada e os bordões de “segurança”, “saúde” e “educação”. Sem contar com o candidato que faz questão de dizer que é honesto. Destes, honestamente, são os que mais tenho medo. Nem vou reclamar mais da ausência absoluta de projetos de políticas públicas para a cultura. O máximo que os candidatos ao governo conseguem balbuciar quando tratam do tema é “boi de mamão e Oktoberfest”. Quase todos acham o máximo ligar cultura à educação (isso quando não fazem a ligação espúria com o turismo). Educação, senhores candidatos, é um trilhão de vezes diferente, no que se refere à ações públicas, de cultura. Se os candidatos fossem inteligentes, saberiam que a cultura perpassa tudo, inclusive a economia, a segurança e a saúde.

Mas não dá para esperar nada dessa gente mesmo. Talvez, uma grande e ampla reforma política seja, ao fim e ao cabo, o grande projeto que um destes candidatos pudesse apresentar. Mas, sabemos, uma reforma real, para que fosse eficiente mesmo, teria que mexer com privilégios deles próprios. De qualquer modo, deixo aqui algumas sugestões de poeta, que, como diria o Paulo Leminski, não levam perigo à meta.

1) Unificar as eleições. Iríamos às urnas a cada quatro anos para eleger de vereador a presidente. Evitaríamos assim essa mania feia que alguns candidatos têm de não cumprir seu mandato até o fim, além de ser uma economia enorme ao País. 2) Adotar o financiamento público das campanhas. 3) Adotar o regime parlamentarista. 4) Acabar com os programas eleitorais gratuitos de rádio e televisão (que de gratuitos não têm nada). 5) Acabar com a obrigatoriedade do voto (o Brasil ainda é um dos poucos que adotam essa prática antidemocrática). 6) Acabar com a imunidade parlamentar e com o foro privilegiado.

Mas a mais importante de todas as reformas políticas seria aquela em que os tribunais eleitorais fossem ágeis (contratar mais juízes? usar súmulas vinculantes?) porque uma das coisas mais bizarras do sistema político é um governador ou um prefeito se manter no cargo sob suspeita de crime, seja eleitoral, seja de corrupção.

Diário Catarinense, 25 de setembro de 2010

18 de setembro de 2010

A suspensão do juízo

O que quer de mim o mundo com tantas evidências? Por que vivo aqui, nessa cidade de quase um milhão de habitantes, cercada de mar por todos os lados, administrada por uma gente tão incapaz, tão inferior, tão despreparada que dá pena mesmo é de quem a escolheu. De que sou feito? De que memória me alimento, se na maioria das vezes confundo o que sonhei com o que vivi, o que vivi com o que inventei e com o que pretendo viver? Por que algumas pessoas são tão próximas de mim, e por que dessa forma e não de outra?

Se o mistério é não haver mistério, como meu comparsa Álvaro de Campos me soprou no cérebro, me sobra olhar sem pensar, como ele mesmo fez no dia de sua mais aguda lucidez. Eu rio quando olho e não penso. Pode ser um rio de acidente geográfico, pode ser o rio da primeira pessoa do verbo rir. Eu rio quando lembro do filósofo Pirro de Elis, que não fundou o pirrismo, mas foi o primeiro sábio a pedir o silêncio, a dizer que diante de algo que não sabemos o melhor mesmo é calar. Sim, a suspensão do juízo. É isso que acontece quando olhamos um rio e ele nos suspende, como um fio, como uma baleia que não quer mais nadar, como um homem que, de um dia para o outro, decidiu fazer duas coisas no resto de sua vida: caminhar o suficiente para dar a volta no globo terrestre e amar sua mulher.

Não pense que andar a circunferência do mundo e amar sejam tarefas para qualquer um. São de igual delicadeza, ultrapassam todas as miudezas do embate tão prolixo e pobre das campanhas eleitorais. São tão superiores a qualquer juízo que não leve em conta a história recente, ou o desconhecimento da mensagem cifrada de Hermes, ou Mercúrio, como queiram.

“Eu não sei mais nada”, disse o homem, e partiu com sua amada – a qual conheceu dentro de uma caixa com uma carta dentro – para uma volta ao mundo, com o juízo suspenso igual a um fio, como um rio a quem se deve olhar com a reverência de quem não precisa dizer mais muita coisa.

13 de setembro de 2010

Invariavelmente as mesmas

Algumas questões filosóficas são irrespondíveis mesmo. Até já me conformei com isso. Muitas pessoas, diante do inexplicável, decidem tomar emprestado do além, do metafísico, algumas respostas. Principalmente às três perguntas essenciais, tão bem pintadas no Tahiti por Paul Gauguin: “O que somos? De onde viemos? Para onde vamos?”. Da minha parte, já que não consigo crer no intangível, nem no incomensurável, decidi deixar por isso mesmo, viver na ignorância, ser um agnóstico, o que dá no mesmo.

Mas ainda tem muitas coisas que me perturbam, como, por exemplo, balas de gengibre, formigas que comem teclados de computador, pincéis feitos de rabo de cavalo, nuvens com forma de camelo, um avião antes de decolar, navios em alto mar e um trem no deserto. Também vivo me perguntando o motivo pelo qual algumas pessoas estão na minha vida. Nem é o motivo, mas o formato. Por que sempre esbarro com aquele fulano na rua, e ele me cumprimenta? Não sei seu nome, o que ele faz, de onde veio ou pra onde vai. Mas é um rosto familiar, está ali, me chamando a atenção, e não precisamos mais do que o cumprimento.

Sempre achei um mistério o fato de andar numa rua cheia de gente e ter a impressão que aquela massa humana é a mesma de ontem, com os mesmos rostos, o mesmo tipo de passo, uma onda, quase em câmara lenta, que vai não sei pra onde. Também me intriga conhecer alguém e ter a impressão de que se parece com outra pessoa que conheço há mais tempo. Talvez o cérebro tenha um mecanismo que nos resguarde de surpresas faciais, por isso achamos que todo movimento humano, tirando a roupa que a moda impõe numa determinada época, é igual ao de ontem.

Um rosto é uma intriga. Aquela primeira ruga aparecendo no amigo, o primeiro fio de cabelo branco do fulano que conheço desde que quando tinha apenas 20 anos. O tempo e o espelho modificam os rostos, mas nunca as pessoas. Pro bem e pro mal, elas são invariavelmente as mesmas, sempre.

4 de setembro de 2010

A morte do jornal

Nesta semana, o Jornal do Brasil, um dos veículos mais importantes da história do jornalismo brasileiro, anunciou seu fim. Ele deixou de circular em seu formato impresso, mas existirá nas páginas composta por bites e bytes da internet. Os saudosistas do papel reclamam e anunciam a morte do jornalismo como um todo, como se apenas o papel tivesse credibilidade, e como se apenas ele pudesse anunciar uma notícia. Para outra parte, uma geração mais nova, gente que nunca saiu de casa para comprar um jornal na banca, a morte do JB não faz a menor diferença, porque só lê notícia pela internet ou pela televisão.

Há muito que o jornalismo “de furo” perdeu o sentido. Hoje, as redes sociais, e principalmente o Twitter, são os veículos de comunicação do que podemos chamar de “notícia fresca”. Expertos foram os jornais que encheram seus papeis de opinião. Se a tevê e a Internet davam o furo antes do impresso, sobrava ao jornal publicar a opinião para comentar o furo. E foi isso que aconteceu durante, talvez, os últimos 10 anos.

Só que os formadores de opinião começaram a ficar independentes e a ter seus próprios blogues. Mais uma vez, o que salvou os jornais foi mantê-los, ainda que independentes, sobre as asas de seus próprios portais na rede. Mas não é todo mundo que entrou nessa. Para estes, talvez só reste mesmo a transformação, sair totalmente, como fez o JB, do velho e bom papel para o impalpável da internet.

Muitos, porém, ainda pensam que a internet não tem credibilidade suficiente. Mas basta pesquisar na história e ver quanta barrigada o jornalismo também produziu. A diferença é que a internet não tem dono. Qualquer um pode escrever o que bem entender. E se nela tem do ruim e do bom, é apenas um espelho da sociedade. O que teremos que ter no futuro é bons leitores, para filtrar com inteligência o crível do não crível. E talvez tenha sobrado ao jornal impresso não mais o papel de noticiar, mas o de educar, e deixar a notícia para quem é mais rápido que a prensa.

SOBRE O ÓDIO

a cena mais emblemática da insanidade coletiva causada não pelo vírus, mas pelo mentecapto presidente, é a do governador ronaldo caiado, de...