13 de março de 2010

Sobre o direito de dizer

Nessa semana, Alexandre Nodari, doutorando em Teoria Literária e blogueiro, como ele mesmo se define, publicou no seu blogue Cultura e Barbárie excelente artigo chamado A dimensão formal do Direito. Ele questionou o motivo pelo qual os ministros do Supremo Tribunal Federal não deram voz de prisão ao senador Demóstenes Torres, apesar de ele ter cometido “crime de racismo”. Segundo Nodari, o problema está na dimensão formal do Direito. Não importa o crime, segundo o blogueiro, mas sim o modo como ele se deu, ou a forma como as palavras “racistas” foram ditas, no que concordo. Tudo está na forma. Existem duas formas de dominação. Uma pela força, outra pelo convencimento, e este é feito com palavras.

Mas o artigo de Nodari me fez pensar numa questão que me incomoda faz tempo, que é a ideia de “crime de racismo”. Independentemente se o senador cometeu ou não, não seria ela contraditória à liberdade de expressão? Não vejo como problema jurídico o fato de alguém dizer bobagens. Do mesmo modo, palavras como “honra” numa me disseram nada. A justiça brasileira perde muito tempo e dinheiro julgando ações por danos morais, como aconteceu outro dia, quando o publicitário Nizan Guanaes criticou o cantor Bell Marques, líder de um dos milhares de grupos de axé da Bahia. Bell processou Nizan por danos morais apenas por criticá-lo em público. Ora, e quem vai processar o cantor pelas bobagens que ele canta? Eu é que não. Está no direito dele, e azar de quem o consome. Proibir o “outro” agora é o mesmo que proibir a si mesmo no futuro.

Essa proliferação de ações pelo que o “outro” diz pode criar jurisprudência contra a liberdade de expressão. E quando o Direito atinge esse ponto fundamental da democracia, que é o direito do outro dizer o que bem entender, não estaríamos perdidos, confundindo as coisas, e abandonando a própria ideia do Direito?

A criminalização contra a “ofensa” é o reconhecimento dela como uma coisa importante. Pensei tudo isso porque não considero “honra” ou “ofensa” como coisas importantes. Eu jamais ficaria ofendido em ser chamado de qualquer coisa. Nessas horas, dou uma risadinha e viro as costas. Mas talvez eu apenas esteja pensado em voz alta mesmo.

Publicado originalmente no Diário Catarinense, de 13 de março de 2010

4 comentários:

Cachorro que Late disse...

quem foi que disse: "eles não sabem o que dizem?".
muaaak.

Priscila Lopes disse...

Bah, Brüggeman, super concordo contigo.

"Ora, e quem vai processar o cantor pelas bobagens que ele canta? Eu é que não."

Essa questão que você levanta, me recorda situações de escola primária em que a gente se sentia no direito de fazer queixa à professora quando "ofendiam nossa mãe".

Que "boboca".

Anônimo disse...

discordo. não esqueçamos que repartimos nossa liberdade com o Estado, e cabe a ele organizar a vida social, logo, regular o que se diz, bobagens ou não.

Beto Tavares

por júlia eléguida disse...

discordo em dois pontos do que foi falado sobre a liberdade de se falar, um em relação à imprensa e outro envolvendo os funcionários públicos, inclusive deputados, senadores, juízes, promotores, que devem ou deveriam ter mais responsabilidade pelo que dizem e fazem, ou mesmo por sua omissão. tomo por exemplo, o caso da escola base, em que foi noticiado pela imprensa que os alunos sofriam maus tratos e foram estuprados pelos responsáveis pela escola. os donos foram perseguidos e foram à falência, além do trauma psicológico. o jornalismo não pode virar um mero comércio de notícias que são dadas de acordo com seu poder de vendagem. e envolve também uma questão ética, do que pode ser dito, deste modo há uma limitação.

em relação aos cargos públicos, tomo-a, em relação à importância do cargo que desempenham, o caráter de representação de uma coletividade. não é uma mera opinião pessoal, ainda mais um deputado, que está ali para desenvolver leis que irão nos regular. se ele não tem o mínimo repeito pelo próximo, destratando-o simplesmente pela aparência física, o que já é um absurdo, como podemos ter credibilidade em seu trabalho, que afeta, de certo modo, todos os cidadãos.

o assunto é complexo, realmente não sei se a criminalização é o melhor caminho, principalemente se a lei vira mera letra morta, ou apenas uma retratação monetária, sem envolver responsabilidade e concientização.

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