Sábado de Carnaval
Sábado de carnaval é um dia muito chato para o cronista. Primeiro, porque não pode escrever qualquer outra coisa aparentemente séria, porque não haverá leitor para coisas aparentemente sérias. Segundo, porque o escriba de sábado não gosta de Carnaval. Claro, ele é um ranzinza, não gosta de calor, porque dá brotoeja, sofre com ar condicionado, porque quando era criança algum médico lhe arrancou as amígdalas, no tempo em que estas eram apenas tecidos linfoides que não serviam para nada. Hoje se sabe que servem como filtros. Mas, para o cronista, é tarde demais, já não tem filtros para os poluentes do ar-condicionado. Fora isso, toda pessoa que toma umas cervejas acredita que sabe tocar um pandeiro e cantar. E tem mais, ele não tem identificação alguma com alguma tradição carnavalesca, tipo blocos de sujo, escolas de samba, marchinhas, fantasias (pelo menos não as de Carnaval) e sabe-se lá mais o quê que rola por aí.
Fora isso, o cronista tem memórias ruins das últimas vezes em que resolveu ficar na cidade para ver o Carnaval. A violência foi assustadora, as letras das escolas eram muito ruins, repetiam as mesmas palavras de todos os outros carnavais, coisas como: brilho, herói, sonho, fantasia, divino, coração, e por aí vai. E mais, qualquer letra se encaixa em qualquer das melodias. Mas tudo bem, a ideia do Carnaval é essa mesmo. Nada de conversa boa, crítica sensata, filosofia ou muita criatividade. O negócio é a alegria. Mas para o cronista chato, apenas uma falsa alegria, ainda que para a maioria a falsidade do riso seja, talvez, a coisa mais essencial da vida.
O Carnaval é apenas uma extensão, ou a potencialização do que todos fazem o ano inteiro. E se todos admitissem isso, talvez o ano todo fosse bem melhor, menos hipócrita, e o Carnaval seria apenas um grande feriado para o descanso necessário do grande Carnaval que é o desejo humano. E o desejo, é uma pena, muita gente deixa apenas para alcançar alguns dias no ano, exatamente no Carnaval. Se o que se quer do Carnaval acontecesse o ano todo, é bem possível que as letras dos sambas fossem bem melhores, as vozes mais afinadas e essa concentração de desejo, violência e falso riso seria diluída, e, por isso, mais criativa. Decididamente, o sábado de Carnaval, para o cronista, é um dia muito chato.
6 comentários:
é, "a falsidade do riso"... tão triste de ver.
fábio, queridão,
gostei.
aliás, também gosto de carnaval, mas detesto ar-condicionado (embora tenha, ainda (tenho quase certeza), as amidalas).
saudade de ti.
caso interesse, tem uma coisa aqui pra ti...
http://jeanmafra.blogspot.com/2010/02/e-sempre-mais-dificil-ancorar-navios-no.html
bueno, pois é: o brasil, então, fica sendo o país do carnaval, do futebol e dos 'reality shows' (na tv e na política)... será que ainda dá conserto? - e já que o ano brasileiro só começa depois do carnaval, poderíamos propor um movimento para alterar essa festa para o 1º de janeiro!
abraço,
maloio
ps.: bom retorno!
é uma falsa impressão essa de que brasileiro gosta de carnaval: não gostamos, ao menos 70% de nós ... ocorre que a minoria é assaz barulhenta e não há como ficar indiferente a ela.
mas me rendi: e isso por que as moças de regra acham o meu papo muito chato e se assustam comigo logo na primeira conversa; no carnaval, todavia, as palavras viram todas "papo de bêbado", e elas me descobrem o rei da simpatia, ficante em potencial e beijante competente, tudo diluído em 10% de teor alcóolico.
:)
Custei a compreender que a fantasia
É um troço que o cara tira no carnaval
E usa nos outros dias por toda a vida....
Aldir Blanc e João Bosco
Custei a compreender que a fantasia
É um troço que o cara tira no carnaval
E usa nos outros dias por toda a vida....
Aldir Blanc e João Bosco
Postar um comentário